11.3.07

O desenhador de mesas III

Talvez um dia destes reconheça em alguém estirado nas escadas do portão o meu desenhador de mesas..Quem sabe, talvez o encontre. Ou não, que é o o mais provável. Ficará para sempre alguém sem rosto, cujas mãos são desenhos inspirados e que existe em mim como um vago esquisso desenhado a lápis de carvão. A preto e branco.
Ele anda por aí, mas eu não sei por onde. Entramos todos os dias pelo mesmo portão, quem sabe até nos cruzamos na mesma paragem de autocarro apinhada de gente de mochila às costas ou livros debaixo do braço. Quem sabe, até já passámos ao mesmo tempo na passadeira da rua em frente à ou nos sentámos ao mesmo tempo na escadaria grande. Partilhamos a mesma sala, a última do corredor, a todos os dias nos sentamos na mesma mesa de tampo verde, pequena e acanhada, onde é preciso fazer uma ginástica impossível para acomodar as pernas. Mas não sei quem ele é, nem ele sabe da minha existência e de como, sempre que chego à sala, procuro num ritual quase sagrado que todos os dias se repete, os seus esboços inspirados.
Na quinta carteira da fila da janela. A do tampo verde. Todos os dias nos sentamos, e a sua expressão inconsciente é-me revelada na profusão de desenhos que recobre a superfície verde de madeira. Eu e ele. O desenhador de mesas.
Onde estás?